Skip to main content
Em destaquePara o Público

Os Disruptores Endócrinos e a Tireoide

By 8 de março de 2010julho 8th, 2020No Comments

Por Cintia Salomão Castro

A maior parte da população não sabe o que são os disruptores endócrinos, desconhecendo os efeitos que essas substâncias químicas presentes em produtos de largo consumo podem trazer ao funcionamento das glândulas endócrinas – inclusive a tireoide. 

O disruptor age dentro do sistema endócrino, podendo até interromper o próprio mecanismo hormonal. A suspeita é que eles possam causar distúrbios na síntese, secreção, transporte, ação ou na eliminação de hormônios. Alguns dos componentes que agem como disruptores são utilizados pelas indústrias e estão presentes em protetores e filtros solares, agrotóxicos, panelas e embalagens plásticas 

PFOA
Vários estudos têm mostrado indícios da relação entre a presença de altos índices desses componentes no sangue e a manifestação de doenças endócrinas. Uma pesquisa publicada no periódico científico Environmental Health Perspectives revelou que pessoas com doses elevadas de PFOA no sangue têm mais chance de terem disfunções na tireoide do que indivíduos com uma quantidade pequena da substância no organismo. O assunto foi tema de reportagem do jornal O Globo do dia 24 de janeiro (“Venenos legalizados”).

Frigideiras e Carpetes

PFOA é a sigla, em inglês, para ácido perfluorooctanoico. Trata-se de um componente químico comumente presente em produtos largamente usados, como frigideiras antiaderentes e coberturas de carpetes à prova de manchas.

A equipe da Universidade britânica de Exeter estudou as análises sanguíneas de cerca de quatro mil pessoas da população dos Estados Unidos, com dados obtidos entre 1999 e 2006. Destes, mais de 16% das mulheres e 3% dos homens relatavam problemas de tireoide. A autora do estudo, a Dra. Tamara Galloway, ressalta a necessidade de novas análises para confirmar os possíveis efeitos nocivos do ácido.

No entanto, ainda não pode-se dizer que está definitivamente comprovada a influência do PFOA no mecanismo da tireoide, conforme explica o vice-presidente do Departamento de Endocrinologia Básica e membro do Departamento de Tiróide da SBEM, o Dr. Magnus Dias da Silva. Ele esclarece que trata-se de um estudo de associação, e não de mecanismo de doença:
 
“Após um criterioso ajuste estatístico, somente ficou evidente a associação de relatos de doença tireoidiana entre indivíduos do sexo feminino e quando a medida da concentração do ácido PFOA no sangue estava acima de 5,7ng/mL”, afirma.

Predominância Feminina
O Dr. Magnus lembra que, de modo geral, as doenças tireoidianas são mais comuns entre a população feminina.

“A força estatística dessa associação mostrou uma chance de 2,24 vezes de uma mulher nesse quartil de relatar alterações tireoidianas em tratamento vigente. Essa relação não foi observada nos homens. Enfatizo também que nem sempre os estudos de mecanismo toxicológico ou de associação concordam nos estudos conduzidos junto ao homem e em animais, tendo em vista seus mecanismos de metabolização e cinética de toxicidade diferentes”, afirma o cientista, que também é professor adjunto do Departamento de Bioquímica da UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo).

Atualmente, o Dr. Magnus estuda casos de pacientes diagnosticados com tumores gonadais, cujas famílias foram expostas, por longo período, a pesticidas usados em cultura de tomates. “Esse alerta foi protagonizado inicialmente em 2002 pela. Dra. Ieda T. Verreschi, com quem colaboro desde então”. 
Constatou-se uma associação com  agentes tóxicos perturbadores do nosso metabolismo, apontados inicialmente pela zoóloga Theo Colburn em 1991. 

Hoje, importantes eventos são realizados no mundo para a melhor compreensão dos mecanismos toxicológicos e registram as evidências dos danos à nossa saúde e no ecossistema, contribuindo para regulamentar o uso industrial desses agentes” – explica.


Bifenilas e Ftlatos

Outras substâncias suspeitas de interferirem no mecanismo da tireoide são as bifenilas policlorinadas ou PCB (compostos usados em transformadores), as quais causam redução dos níveis de hormônios tireoidianos e interferem na síntese de esteróides gonadais e adrenais de forma complexa. 

Por sua vez, os chamados BPAs (derivados do Bisfenol-A, substância usada na indústria do plástico) induzem disfuncão da tireóide, do sistema nervoso e imune humoral. Outros estudos relacionam a exposição aos BPAs a doenças cardiovasculares, hepáticas e ao diabetes. Já a exposição prolongada a ftalatos (compostos químicos que deixam o plástico mais maleável) pode induzir feminização em homens, conforme demonstram estudos publicados. 


Desreguladores Endócrinos
O endocrinologista adverte que, além dos itens já conhecidos, existe um universo de outros compostos químicos derivados que escapam à investigação científica:

“Essa lista não para de crescer. Sabe-se que esses desreguladores estão presentes em inseticidas, detergentes, repelentes, desinfetantes, fragrâncias, solventes, retardantes de chama, colas, antiaderentes da construção civil ou mesmo em utensílios de cozinha. Frequentemente, estão nos efluentes industriais clandestinos, residenciais ou mesmo em estações de tratamento de água e esgoto visivelmente mal fiscalizadas”, alerta o especialista, que também é como co-editor dos Arquivos Brasileiros de Endocrinologia e Metabologia (ABE&M). 

Na edição de fevereiro de 2010  (volume 54, número 1), os Arquivos Brasileiros de Endocrinologia e Metabologia (ABE&M) trazem uma revisão intitulada “Contaminantes ambientais e interferentes endócrinos”, de autoria de Fontenele, e colaboradores.