As disfunções subclínicas da tireoide são caracterizadas pelas alterações no funcionamento da glândula, mas que – em sua maioria – não apresentam sintomas. Do ponto de vista da evolução do desenvolvimento de um transtorno tireoidiano, elas são consideradas como um estágio mais leve e precoce da fase manifesta, na qual os pacientes costumam apresentar sinais da doença.
Segundo o Dr. José Sgarbi, ex-presidente do Departamento de Tireoide, a prevalência de doenças subclínicas na população geral assintomática é elevada. “O hipotireoidismo subclínico varia, no Brasil, de 5-10%, sendo mais comum nas mulheres após a menopausa e em idosos. O hipertireoidismo subclínico fica em torno de 5-7%. O que mostra que uma parcela significativa de adultos desconhece que tem uma doença tireoidiana subclínica.”
O endocrinologista destacou que estudos têm demonstrado que a exposição a uma disfunção tireoidiana subclínica, mesmo leve, por períodos prolongados (em geral acima de 4 a 5 anos) pode evoluir para complicações, tanto do sistema cardiovascular quanto do ósseo.
População de Risco
Assim como as formas manifestas, as doenças subclínicas tem um predomínio maior no sexo feminino e nos idosos. O Dr. Sgarbi ressaltou que se deve ter muita atenção com as gestantes. “Nas gestantes o risco é, particularmente, importante, pois mesmo na fase subclínica pode evoluir com desfechos desfavoráveis maternos e fetais.”
Além das mulheres (na pós-menopausa e gestantes) e dos idosos, estão também entre os grupos de risco: pacientes com histórico pessoal ou familiar de doença tireoidiana ou doenças autoimunes da tireoide ou não (Tireoidite de Hashimoto, diabetes tipo 1, lupus eritematoso sistêmico, artrite reumatóide, etc); indivíduos obesos; diabéticos; com depressão ou dislipidemia; e aqueles que fazem uso de drogas que interferem no funcionamento da tireoide (amiodarona, corticoides e lítio).
Complicações no Coração
Os hormônios da tireoide têm papel fundamental em praticamente todas as células do nosso organismo. Mas os efeitos são particularmente marcantes no coração, órgão que controla múltiplas funções.
“Os hormônios tireoidianos participam do controle da força de contração cardíaca, do ritmo e da frequência cardíaca através da regulação da produção de várias proteínas”, explicou o Dr. Sgarbi.
No hipertireoidismo subclínico, o estímulo continuado, levemente excessivo, que os hormônios tireoidianos exercem sobre as células cardíacas podem causar um descompasso na produção das fibras do coração. Segundo o médico, isso causa hipertrofia (aumento) do coração; desequilibra a contração cardíaca tornando-a mais forte, o que aumenta o trabalho cardíaco, o consumo de oxigênio e, com o tempo, pode ir determinando uma exaustão progressiva dessas fibras, o que leva ao seu enfraquecimento e a insuficiência cardíaca.
“A doença pode causar um descompasso ainda maior e mais frequente no ritmo cardíaco, deixando os batimentos mais acelerados, batendo descompassadamente (a arritmia cardíaca), sendo a mais comum delas a fibrilação atrial, que é uma arritmia complexa.”
Estima-se que de 10% a 15% dos casos de instalação aguda de fibrilação atrial seja causada pelo hipertireoidismo. Segundo o especialista, o problema costuma ser mais grave em idosos e aumenta em até três vezes a chance de ter fibrilação atrial associada com maior risco de embolia pulmonar e óbito.
Complicações Ósseas
Assim como no coração, há também efeitos importantes dos hormônios da tireoide na formação e renovação do osso.
O excesso de hormônios tireoidianos, mesmo no hipertireoidismo subclínico, leva a um desbalanço entre a retirada do osso velho e a formação do osso novo, em favor do maior desgaste em relação à formação. A consequência é a perda progressiva da massa óssea, a osteopenia (perda de massa óssea leve-moderada) e a osteoporose (perda de massa óssea acentuada).
O Dr. Sgarbi afirmou que diversas pesquisas mostraram que o risco de fratura óssea em pessoas com hipertireoidismo subclínico pode ser de até 30% maior, comparado com os indivíduos sem disfunção na tireoide.
O endocrinologista alertou ainda que mesmo nas formas mais leves os riscos, tanto na fase subclínica como na manifesta, são os mesmos. O que vai diferenciar é o tempo de exposição do paciente.
“Nas apresentações clínicas mais acentuadas, um desfecho cardíaco desfavorável, como uma arritmia, pode ser mais eminente. Já nas formas mais leves e subclínicas, quanto maior o tempo de exposição maior o risco. Este é o problema. Nas formas manifestas, o paciente procura o médico pelos sintomas. Na forma subclínica, ele convive assintomáticamente com o problema por anos, quando as complicações aparecem”, concluiu.